11 de junho de 2013

ACOLHEI, A ORAÇÃO.


Oh, Pai, ensina-nos a viver.
A viver, segundo os Teus princípios!
Oh, Pai, abra os nossos olhos
para que vejamos a desgraça,
que há em nossos corações de pedra: 
a hipocrisia, a inveja, o egoísmo,
a arrogância, o ódio e a ingratidão;
sentimentos mesquinhos,
que nos afastam de Ti e do próximo!

Oh, Pai, como amar o próximo se não praticamos o verdadeiro Amor?

Ensina-nos, oh, Pai Eterno, suplicamos:
ensina-nos a viver, segundo a Tua vontade!

Oh, Pai, ensina-nos a estender as mãos
não quando quisermos, 
mas quando Tu ordenares;
ensina-nos a descruzar os braços
não quando desejarmos, 
mas quanto Tu ordenares!
Ensina-nos!

Ensina-nos a ser mais humildes
e aceitar o Outro como ele é...
Ensina-nos a acolher o próximo
com as mãos, os braços, a alma e o coração,
pois somos todos pecadores,
somos todos desgraçados!

Ensina-nos a acolher os aflitos com atitudes
e não com palavras;
os desabrigados, os necessitados, os carentes
e os desamparados!
Ensina-nos a acolher os indigentes
e os desprezados,
pois neles está o clamor do Teu filho,
que, um dia, nos acolheu, incondicionalmente,
e padeceu por todos nós
pendurado num madeiro
para que não morrêssemos,
mas recebêssemos a Salvação,
o Teu amor dadivoso
e a Tua misericórdia eterna, 
que nos alcança incessantemente, 
ainda que não sejamos merecedores de Tão maravilhosa Graça!

Acolhei-nos, Senhor,
com Teu perdão e Tua paz,
pois, assim, seremos Teus filhos como todos aqueles
que estão abandonados nas ruas, nos becos, nos presídios,
nos asilos, nos orfanatos e nos hospitais;
todos entregues à dor, à fome, ao sofrimento e às lágrimas...

Acolhei-nos, Senhor, com Tua bondade infinita,
e livrai-nos da miséria espiritual,
que nos aprisiona e nos consome todos os dias...

Ensina-nos a prática do acolhimento genuíno, Senhor!
Clamamos a Ti, oh, Pai: acolhe-nos!
Acolhei-nos!


22 de janeiro de 2012

ACOLHER, PRA QUÊ?


A lei universal, que estabelece a existência dos fenômenos, que conhecemos, desde os visíveis até os não - visíveis, para os nossos olhos, tão míopes, não afere o grau de importância daqueles pelas devidas ocorrências às quais estão sujeitos, sejam os de natureza física ou espiritual, e os que adormecem no mistério insondável de nossa vã compreensão. Assim, a despeito da observação posta, cumpre notar que, em geral, o ser humano tende a superdimensionar os eventos, que raramente acontecem no mundo, considerando-os, desse modo, especiais, mais importantes  que os demais; e, por conseguinte, vitais, em detrimento de outros, que, por serem fatos que estão presentes no cotidiano de todos, são, lamentavelmente, vistos como algo desprovidos de qualquer importância. O incomum não está em posição de supremacia em relação ao comum, mas, afirmativamente, o oposto.




Esta é a estória imutável do óbvio, que, por sua singularidade, que é o amálgama unindo a sua essência à existência do ser humano, emerge como elemento comum e revela o traço do incomum do que é; do que tem de ser, implacavelmente; coluna de sustentação da realidade, e que suporta a estrutura primordial da vida. Assim, é o nascimento dos seres e seus desaparecimentos inevitáveis; a maternidade, por exemplo, cujo fenômeno se dá de forma ininterrupta; o dia e a noite em suas trajetórias cíclica e eterna; a luz e a escuridão; a palavra decifrada e a mensagem velada. Mosaico complexo e absolutamente ímpar, que define o contorno a desenhar o traço do Humano - no risco do ser na terra -, e que move seu coração para a sua verdadeira vocação: a prática eloqüente e inquestionável da CARIDADE. 




A caridade tem, na obviedade de sua função, o traço distintivo e inconfundível, que a torna diferencial no universo das atitudes que as pessoas de bem-querer devem ter para a efetivação da prática do doar-se, de forma integral. Ser caridoso, neste sentido, não é um estado de ser, mas, antes, é uma condição inerente a todo ser humano, que, mais do que se predispor a ajudar àquelas pessoas que necessitam de auxílio, em sentido amplo, é, acima de tudo, o despertamento à consciência sobre algo que, infelizmente, está adormecido nos milhões de mentes de muitas pessoas que sequer pensam sobre a prática do Bem em sua concretude. Corpos movidos pela vaidade crescente por uma busca desenfreada de si mesmos; olhos voltados para um interior vazio e apodrecido de valores quando muitos necessitados e aflitos clamam por um pedaço de pão para matar a fome ou um pouco de água para matar a sede.




O senso comum fossiliza um equívoco que precisa ser reparado. Qual seja: o de que alguns seres, vistos como entidades iluminadas, nascem e são dotados de um poder especial para fazerem o bem em detrimento da maioria, que, por sua vez, é destituída de tal estado prodigioso; o que, em análise final, é uma falácia, pois todos são iguais perante às leis da vida, a Deus, caso as pessoas acreditem na existência de uma inteligência superior que criou a tudo e a todos; e, principalmente,  porque qualquer um pode e deve fazer tudo que esteja relacionado à prática do Bem. Assim, a ideia de que poucos podem e muitos não podem, ou de que poucos foram chamados para o exercício da prática do Bem, é, definitivamente, uma sentença falsa, e que, em última análise, atende a interesses escusos daqueles que investem na continuidade da desgraça batendo à porta dos milhões de desamparados e relegados à margem da exclusão social, em todos os sentidos, se é que existem portas para estas pessoas abrirem, pois fechadas estão há muito tempo para estes que não têm direito ou que jamais tiveram direito a um teto, a um prato de comida e muito menos à dignidade - o maior bem que alguém pode gozar aliado a um nome: à cidadania, em sua forma verdadeira e eficaz.




O sentido do acolhimento e, claro, a ação do ACOLHER, em amplitude máxima, resgata, para além da identidade perdida daqueles que estão excluídos do código social, o sentido de humanidade que pensamos trazer em nossas consciências, mas que, paradoxalmente, flutuam ao sabor das marés das conveniências devido ao jogo palaciano das máscaras, no qual, invariavelmente, estamos todos envolvidos, e pela hipocrisia, que impera na sociedade cruel que diz praticar o bem, mas que opera a inversão dos valores que deveriam ser outros. A prática do Bem, em verdade, não dista da sociedade, antes é parte inerente de todos os componentes sociais. O jogo tensional, provocado pela falta de humanidade ou pela desumanização das pessoas, que foram tragadas pela dita sociedade de consumo, prova o quanto estamos presos a regras que, em estágio final, determina o grau do adoecimento e da perdição progressiva e monstruosa que nos acomete de forma insidiosa.




Acolher o outro: pra quê? A  indagação que intitula este texto é, de forma inconteste, uma confissão coletiva de um ato que deveria ser praticado por todos, sem exceção, e que denuncia a omissão da maioria das pessoas, senão de todas, que deveriam fazer alguma coisa para minimizar os efeitos danosos sobre o outro não - assistido, e que é tão ou mais humano que todos nós, que desfrutamos do dito bem-estar social - cenas dantescas de uma civilização predatória, que sobrevive às custas das mazelas alheias. O princípio do altruísmo ou a busca por um mundo mais igualitário emerge desse questionamento desnecessário, pois a noção fundamental, que leva um grupo social, engajado em ações similares, visando o acolhimento dos aflitos, é a fagulha a incendiar corações, nações e o mundo em prol do verdadeiro sentido de coletividade, que é o da repartição justa do pão com aqueles que mal sabem o que é migalhas, pois nada lhes sobra para  o  sustento e o direito à sobrevivência.




A inconsciência e/ou falta de instrumentos daqueles que estão mergulhados em uma miséria sem fim é mais legítima do que a consciência e o aparato que os ditos favorecidos dispõem, mas que não são utilizadas nem para o fim ao qual se destinariam ou, no pior dos mundos, se descartam pelo ato condenável da omissão, que, por força da egolatria, nos mantêm, consistentemente, na zona de conforto. Eis aqui, portanto, o ponto de estrangulamento, que constrange a ação da prática do Bem, em sentido genérico e específico: há um fosso terrífico que nos abisma diante de nossa face torpe, e que nos pressiona contra a humanidade que afirmamos cientificamente ser, mas que apenas temos. Temos a humanidade, mas não somos a humanidade. Somos a própria desumanidade, deflagrada pelo impulso nefasto do egoísmo, que nos distancia uns dos outros, e que, como num ritual de pura selvageria e barbárie, produz, em nossas mentes coletivas, sociais, civilizatórias e destruidoras, a equação instantânea de eliminação do outro, em cadeia, revelando, desgraçadamente, a nossa bestialidade, a nossa perversidade e a nossa mesquinhez. 




A função do acolhimento do outro é, para além dos questionamentos de ordem ética e religiosa,  respectivamente, um preceito moral e pedagógico. A consciência que devemos ter, de forma uníssona, sobre o comportamento didático diante da vida que temos e daquela que queremos ter, para todos nós e para as gerações futuras, é um problema de natureza didática. Os ensinamentos crísticos, antes de serem entabulados como mandamentos espirituais, em verdade, são determinações de cunho didático, pedagógico e, em análise final, construções lógicas acerca da realidade como se apresenta para os favorecidos e desfavorecidos. Não há véus que encobrem ou sofismas que camuflam a verdade que paira sobre os que necessitam de amparo. Não há, também, falseamentos que impedem as pessoas, que se proclamam dadivosas, a praticarem o Bem, no sentido messiânico de sua constituição: pleno, único, imutável e, portanto, universal.




A prática e as ações oriundas do ACOLHER impõem uma regra transparente e inviolável. A saber: ou acolhemos o Outro, em seu estado precário de sobrevivência, de corpo, alma e coração, ou perderemos a oportunidade de aprender os ensinamentos que Cristo transmitiu a toda Humanidade, e, para o nosso infortúnio, engrossaremos a fileira dos hipócritas, que, efetivamente, padecerão com a destituição da Graça; e, errantes, caminharemos pela vereda hedionda da desgraça; um caminho somente de ida; um caminho de dor, um caminho sem fim.


28 de agosto de 2011

ACOLHER, COMO?

                                           
                                              Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei.
                                                                                                                                                Mateus 11 : 28.

A premissa para o Acolhimento é o Amor - princípio universal e imutável, por excelência. A regência do Amor, no entanto, é algo que ultrapassa a mera intenção de ajudar, resgatar ou de exercer a prática efetiva do acolher o Outro em sua amplitude máxima. Prática que deve ser pautada em ações de caráter contínuo; e protegidas, dessa forma, contra qualquer sinal de interrupção no decurso de sua atividade. Assim, a coerência entre a regra, que institui e torna possível o Acolhimento e a ação deste último, propriamente dito, são, em módulo consonante, os índices determinativos de uma tarefa que logrará êxito se o Outro a ser acolhido for plenamente alcançado em etapa final.

Ora, se o Acolhimento é lei promulgada para viabilizar, de forma concreta, o exercício para amar incondicionalmente o Outro, o próximo; e, neste caso, o pobre, o aflito e o necessitado, que vivem anonimamente nos subterrâneos da vida, o Amor, em sua flexão diária, deve, pari passu, ser o reflexo fidedigno do princípio fundamental. O contrário disso revela um apego superficial ao mandamento crístico, que é amar o próximo como a si mesmo, e, por conseguinte, invalida todas as ações que são calcadas, inconsistentemente, em posturas levianas, dúbias e hipócritas.

Para acolher, portanto, é necessário amar; mas para amar é necessário compreender. A compreensão, afirmativamente, constitui-se no itinerário fundamental e único para a construção do Acolhimento em sua esfera de crescimento venturoso e constante. Há que se pontuar, inexoravelmente, que não  há meio acolhimento ou acolhimentos que recrudescem às leis furtivas ou às intempéries advindas de modismos ou algo parecido. O Acolhimento é um fenômeno dadivoso, espontâneo, e que nasce nos corações daqueles que amam o Outro, independentemente de sua condição no mundo, seja econômica, étnica e / ou cultural. Este é o Acolhimento que rompe barreiras e finca a verdadeira bandeira do Amor em um mundo que, para aqueles que exercem a prática coerente do Amar, não existe a palavra pátria. Neste sentido, o vocábulo cidadania redimensiona o sentido do fazer o bem ao próximo e atinge o estatuto de princípio universal. 

Como pensar, então, no Acolhimento, se há limites impostos por valores terrenos e ideologicamente questionáveis nos grupos sociais? As pessoas que preferem trilhar esse caminho, com efeito, estão na contramão da história porque os efeitos da globalização, apesar de todos os percalços oriundos daquela, promovem bons augúrios, e, neste sentido, o Acolhimento preconizado pelas pessoas de boa vontade só tem e terá a sua razão de ser, na atualidade e nos tempos vindouros, se a ação efetiva do Acolher atingir este patamar globalizado.

E a compreensão é o estágio natural que se desenvolve a partir da consciência individual de cada um. Quanto maior for a consciência acerca daqueles que necessitam ser acolhidos, em todos os sentidos, maior será a compreensão referida nesta explanação. Cumpre ressaltar, portanto, que é pernicioso pregar o Amor, se este nobre sentimento não advir da compreensão e da consciência dos homens e mulheres, verdadeiramente engajados na prática do Bem. Daí o predicativo do amor em sua modulação exponencial: o de ser incondicional; desde o seu fundamento à sua ação inequívoca, que é a de transformar vidas permanentemente. 

Compreensão e consciência, de mãos dadas e balizando forças, formam o prumo ideal de uma balança, que será revestida pelo bom senso. E bom senso é pérola nas mãos daqueles que buscam incansavelmente a sabedoria. Sabedoria que não provém de livros, mas que vem da vida; entre vales e campos floridos, desertos e caminhos verdejantes, onde as palavras de ordem são a fé, a visão e a perseverança. Sementes para plantações sadias e de colheitas certas e abastadas. Os frutos dessas sementes são os resultados equânimes de atitudes torneadas pela retidão e pela preservação inquestionável dos valores que tornam o ser humano o veradeiro reflexo da face de Deus na terra.

O conjunto harmonioso, que reúne em tomo singular a compreensão, a consciência, o bom senso e  a sabedoria, é, em percepção medial, a consolidação dos componentes necessários e indispensáveis para que o empreendimento universal denominado Acolhimento alcance o objetivo final, que é o de abraçar o Outro da maneira como ele estiver e de onde ele vier, sem preconceitos, sem discriminação; totalmente livre das amarras que criam segmentos, submundos e subespécies de pessoas como se o paraíso celestial fosse dividido em classes, subclasses, ou em partes distintas para seres privilegiados e para almas desamparadas.

O amor incondicional emergirá deste encadeamento perfeito, onde a beleza estará no reconhecimento da presença inconteste do espírito santificado que dos altos céus é derramado pelo Altíssimo em fontes constantes e inesgotáveis. Beleza rara, que eleva os homens e as mulheres de boa vontade a um patamar único de sensibilidade para facear o abandonado, o carente e o necessitado; e poder se verem no olhar miguado de cada um como se estivessem todos diante do espelho de suas casas.  Neste encontro haverá não só reunião de todos estes elementos essenciais para a prática do acolhimento, mas, principalmente, a vigência do AMAR, que não se concretizará apenas no estender a mão àqueles que estão em vias de perdição, seja física, seja espiritual, mas no câmbio entre aquele que decide amar e aquele que decide ser amado; aquele que decide acolher e aquele que decide ser acolhido. Uma vez sendo amado o Outro, o amor retorna para o seu porto originário: para aquele que ama; uma vez sendo acolhido, o desesperado, o seu desespero também trilha o caminho de volta, pois o desespero também faz parte da vida dos que se sentem vocacionados para a ajuda ao próximo, pois todos são e estão desamparados; todos são e estão carentes da misericórdia de Deus.

O Acolhimento não é uma onda que navega em mares plácidos e moderados nem tampouco concede a suave brisa do amanhecer, com direito a poentes resplandescentes àqueles que pensam que a prática do Acolhimento é honraria sem esforço. O Acolhimento, antes, exige a renúncia. A renúncia de si em detrimento do Outro; das bocas famintas, dos corpos que sentem frios, das lágrimas que precisam ser enxutas e dos corações que necessitam de uma palavra de carinho, de ternura e de fé.

O Amor, com efeito, é a chama que dá força à prática do Acolhimento, mas, para além das virtudes, que todos devem cultivar em suas vidas diárias, deverá haver, de forma cabal, o esvaziamento de si para que o corpo seja casa que acolhe, seja templo que se doa, seja abrigo que recolhe, e seja, finalmente, pão que mata a fome e água que mata a sede de quem está sob os trilhos da miséria.

Vós estais preparados para Acolher? 

10 de julho de 2011

ACOLHER O OUTRO, POR QUÊ?





                                         Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de
                                                      beber; era estrangeiro e hospedastes-me;
                                                      Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão, 
                                                      e fostes ver-me. 
                                                                                                                                    Mateus 25 : 35-36.


Pensar na prática redentora do Bem como algo inerente à natureza humana, e que, paulatinamente, tem se tornado algo obsoleto nos dias atuais, constitui-se, para a preocupação de muitas pessoas de boa vontade, um paradoxo sem precedentes em um mundo, cujas fronteiras foram dizimadas em nome de um projeto geopolítico e geoeconômico denominado globalização. Realidades conflitantes, cujas forças antagônicas fraturam, sobremaneira, a compreensão de grupos de pessoas que buscam, incansavelmente, através do altruísmo verdadeiro, a construção de um mundo melhor; de uma sociedade igualitária, na qual os excluídos se sentam à mesa para terem, definitivamente, acesso ao alimento necessário à manutenção da vida; a todos nutrientes, sejam físicos, sejam espirituais, e que definem um ser na esfera da Humanidade;  populações, gentes, pessoas e indíviduos sem qualquer tipo de acepção e / ou preconceitos; sem utopias ou ilusões; sumariamente recebidos com respeito e com a dignidade que merecem. 
A civilização, demasiadamente midiática, na aurora do terceiro milênio, caminha na contramão da própria História, ao impedir, de todas as formas, aqueles, que são marginalizados sistematicamente, devido à pobreza, à miséria e ao abandono total da sociedade, de gozarem do direito pleno à cidadania em todos os seus aspectos. Se, por um lado, o mundo teve suas distâncias encurtadas, e, portanto, teoricamente, as diferenças econômicas e sociais entre povos e nações poderiam ser reduzidas em prol das populações carentes, por outro lado, o que se atesta é o contrário, pois a detenção de informação, cada vez mais concentrada nas mãos de pequenos grupos, tem gerado megapoderes, e que, em última análise, aumentou brutalmente o fosso que divisa pobres de ricos no planeta. O império do Ter não só consolidou suas bases em uma sociedade capitalista e neoliberal como também tem esmagado a pátria do Ser, cujos representantes são os emblemáticos homens e mulheres de boa vontade - padrão de conduta moral e de enlevo espiritual -. mas que não têm acolhida nas sociedades informacionais do século XXI.
O acolhimento do Outro, como atitude que nasce da sensatez de pessoas valorosas, deixara de ser uma prática baseada nos princípios universais do amor incondicional, da compaixão, e da comunhão profunda para se transformar no exercício do grande apelo às almas dadivosas a fim de que aquela ação não se esgote, ou seja esquecida, para sempre, na memória dos homens ditos pós-cibernéticos ou representantes da era digital, em que a tela fria dos personal computer rouba a cena nos tempos hodiernos, aprisiona milhares de mentes em mundos virtuais e desvia, de forma dantesca, o Homem de sua verdadeira essência: a de amar o próximo, praticando o bem, inconteste e incessantemente.
O acolhimento do Outro tem perdido espaços nas culturas modernas na proporção estrutural do Ter, que impõe o câmbio, os interesses e a conveniência como moedas principais para que as pessoas e o mundo, simultaneamente, com seus valores corrompidos existam, ainda que este cenário seja o mais bizarro na trajetória do Homem, nos anais da História. O Ser, por sua vez, em descrédito, se transforma na cédula desvalorizada, e que só tem valor nas mãos das pessoas de bem querer, que acreditam em um mundo mais justo e mais igualitário. Eis, portanto, a balança, com pesos, medidas e valores desiguais. O material se sobrepõe ao espiritual, e o imediatismo, filho dileto das paixões consumidoras e egoístas, entorpece as almas e as vicia em círculos pouco oxigenados. Assim, não há lugar para pregar o amor genuíno, que é fundamentado na prática do doar-se em detrimento de outrem sem esperar qualquer tipo de recebimento ou troca; antes, as lacunas estão preenchidas pelo individualismo, pelo excesso do eu e pelos discursos narcisistas. 
Apelar é chamar; é clamar; é perseverar na voz que é escutada, todos os dias, pela consciência de cada um. Desse modo, o apelo às pessoas para que o Bem seja um ato diário, constante e natural, na vida de todos os seres humanos, é o próprio ato de acolhimento que pode (deve) ser feito sem ser percebido, porque acolher o Outro, certamente, não causa dor em ninguém. Apelar se faz necessário para que o Ser sobreviva; e em sobrevivendo o Ser, sobrevive o Homem, já que o planeta cambaleia por causa de suas dores físicas e espirituais. Insistir na escuta inconfundível da voz da consciência é impedir o seu perecimento, e permitir, no amortecimento das verdadeiras ações do bem maior, o nascimento dos sentimentos torpes, e que afastam as criaturas da essência do Criador, que se consubstancia no amor sem fronteiras; a expressão máxima da Graça, que liberta, protege, redime e salva.
O Ter morre, mas o Ser é eterno. Entre a decadência dos valores humanos e o sonho, com pátrias e bandeiras de todas as cores, nas quais os alimentos chegam às bocas dos carentes, dos famintos e dos necessitados, há uma esperança: a de saber que a causa do acolhimento do Outro é a preservação da existência de quem acolhe. A fatura a ser liquidada não é a entrada gratuita no paraíso, mas a certeza de que o céu aparece diante dos olhos das pessoas que praticam o Bem e daquelas que insistem em viver encasteladas em seus desejos mais recônditos, omitindo-se, covardemente, para serem cúmplices da sombra da morte, que arrasta milhões de miseráveis para covas sem nomes. 
O Bem tem de ser praticado na vida diária enquanto o fôlego entra e sai das narinas do Homem; o clamor e o chamado para a prática do bem só têm razão de ser porque existem pessoas que podem(devem) fazer a diferença, pois haverá um dia em que o acolhimento não mais existirá porque Deus, em sua infinita misericórdia e bondade, deixará de acolher a todas as criaturas, indistintamente. O Mal não triunfará sobre o Bem, mas o juízo, sim, este será a medida de todas as coisas, de todas as pessoas: para aqueles que acolhem e para aqueles que são acolhidos. Quanto aos outros, resta-lhes, ainda, o apelo. É tempo de apelar; é tempo de chamar; é tempo de Acolher! 

6 de maio de 2011

DECLARAÇÃO DO AMOR MAIOR



Eu amo aqueles olhos que perderam as lágrimas porque a dor secou até a esperança de suas retinas;

sim, eu amo a voz daqueles que foram silenciados pela fome e pelo cansaço de ouvir não dos insensatos!

Eu amo as mãos sôfregas daqueles e daquelas que, estendidas, clamam por um pedaço de pão ou uma palavra de afeto...

Sim, é verdade, eu amo os corpos desnudos das pessoas que tremem em invernos longos e ardem em verões infernais sem terem feito mal a ninguém!

Eu amo aqueles e aquelas que não têm nome, não têm casa, não têm pai, não têm mãe, não têm irmãos, mas que podem ter amigos e irmãos espirituais, que têm nome, que têm compaixão, e, acima de tudo, amor próprio para lhes estender a mão...

Eu amo os que andam descalços, os que dormem ao relento e os que não têm pátria, 
porque em cada um deles há um pedaço de mim:
esta carne doída e sangrada que clama a vida de um homem que jamais morreu!

Sim, eu amo a todos os aflitos, perdidos, famintos, sedentos e necessitados, 
porque neles eu encontro um JESUS, que, crucificado, ressuscitou para nos ensinar a AMAR O PRÓXIMO incondicionalmente! 

Para ACOLHER, é necessário AMAR; para amar, é necessário MORRER; para morrer, é necessário RENUNCIAR; para renunciar, é necessário HUMILHAR-SE; para humilhar-se, é necessário RENASCER!


Eu amo a todos os que leram esta DECLARAÇÃO DE AMOR, pois você, como eu, precisamos, também, ser amados, pois somos iguais a todos os carentes e desamparados, que buscam no Alto o AMOR e o ACOLHIMENTO do PAI, que jamais nos abandona...
Para que o amor seja eterno, irmãos meus, amemos! 

9 de outubro de 2010

A problemática da fome no mundo

          
         O reconhecimento irrefutável de que, no limiar do Terceiro Milênio, haja no planeta azul, chamado Terra, mais de 1 bilhão de pessoas, atingidas pela fome, e espalhadas nos cinco continentes, segundo dados oficiais, atualizados e publicados pela FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) é, indubitavelmente, uma realidade aterrorizante, se considerarmos os números que crescem, de forma alarmante, de um lado, associado à escassez de alimentos, que assombra as populações, do outro lado. 
                Nesta diretriz, é imperioso salientar que tais indicadores não se constituem em motivo de regozijo ou deleite; nem para quem trabalha no sentido de reduzir a cifra bilionária dos famintos nem tampouco para essas pessoas, que, a cada segundo, sucumbem, diante da miséria de toda ordem, aumentando o número de covas, e tornando, por conseguinte, a mendicância em uma realidade longe de ser superada em tempos atuais.
                   É salutar a existência de diversas iniciativas, espalhadas pelo mundo, de milhões de ações coordenadas, sejam individuais e/ou coletivas, emanadas dos movimentos civis ou de fontes governamentais que atuam, com alguma eficácia, nos campos sociais e econômicos, respectivamente. Neste caso, além dos organismos institucionais, circunscritos às esferas públicas (órgãos federais, estaduais e municipais), no Brasil, há um número considerável de ONGS (organizações não – governamentais), que surgiram, no lastro da modernização do estado novo, para atuar em várias áreas, antes jamais enfrentadas, adequadamente, pelos planos de governos anteriores à chamada Era FHC, devido à inexistência completa de políticas públicas para diversos segmentos da sociedade civil, como é o caso da Fome no país e pela falta de sensibilidade das autoridades, de uma forma geral, que não percebiam o enorme fosso que fora criado, há muitos anos, entre um Brasil que se moderniza a passos largos e um Brasil que rasteja sobre suas próprias mazelas: é o Brasil dos pedintes, das esmolas, das doenças, da fome, da pobreza e da miséria completa, que não atinge somente as ruas, mas os lares também.
                 A despeito, ainda, das diversas iniciativas, em franco crescimento, para a fortuna daqueles, que são privados de qualquer tipo de assistência, e têm a fome como um estigma, quase que imbatível, instituições religiosas, representantes de várias denominações, com práticas de fé e credo, distintos, entre si, atuam em uma terceira via, estabelecendo um contraponto à realidade avassaladora, que avança, na urgência das tecnologias midiáticas, na primeira década do século 21.
                   Desse modo, é muito comum os mass media estarem abarrotados com programas de ações similares, concorrendo para a tentativa de mudar o quadro melancólico, que, para o desconforto dos homens de boa vontade, não diminui; antes, ao contrário, aumenta, dia após dia, perante os olhos de outros milhões de pessoas que envidam todos os esforços possíveis para evitar que o caos maior seja irreversível. 
                  A análise, aparentemente catastrófica e nebulosa, é real, pois é baseada em dados de uma realidade que desmantela estruturas, calcadas no princípio do amor ao próximo - este fundamento universal, que está preconizado nas Escrituras Sagradas, e que se constitui na força motriz de todos os projetos sociais, que privilegiam o outro em estado de total abandono, sofrendo todos os males advindos da pobreza, da penúria; sendo vítimas contumazes de doenças, da fome e da terrível constatação, que é a de não terem um lar para morarem com o mínimo de dignidade a que têm direito. Os outros, que são anônimos para as estatísticas, e que, por conseguinte, são elementos inexistentes para aferirem o quantum econômico de uma nação ou para sustentarem o PIB interno de um país; os outros, que formam uma legião de desesperados, destituídos da possibilidade de sonhar, e, portanto, privados do direito à vida; sendo tragados pela força suprema da morte, aumentando, abruptamente, o número devastador de óbitos no mundo inteiro devido à falta completa de alimentos e da má distribuição de renda num planeta, em que os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres.
                    O horizonte que se apresenta no início do novo século é paradoxalmente sombrio e uma intimação ao genuíno Homo humanus para o desafio que se posta cristalino, de dimensões terríficas, em tempos marcados pelas tecnologias informacionais: enfrentar a fome e suas personagens principais – os famintos, os sedentos, os necessitados e os cativos, aonde quer que estejam, da maneira como estão, no estado como são encontrados; i.e., destituídos de qualquer instrumento que lhes garanta a sobrevivência, e carentes com as mãos estendidas, clamando por ajuda. Esta é a realidade sem maquiagens ou contornos estilizados. A fome não escolhe casa, rua ou esquina; a fome não escolhe bairro, estrada ou município; a fome não escolhe rodovia, estado ou país; a fome não escolhe continente; a fome não escolhe raças ou etnias; a fome não escolhe cor da pele ou textura de cabelos; a fome, definitivamente, não escolhe endereço. A fome não reconhece fronteiras nem soberanias. Ela invade, se espalha e finca suas garras pestilentas em todos os lugares, vitimando todos os tipos de seres humanos. A fome é ubíqua. Ela se estabelece; e ao fazê-lo, a fome, em sua forma letal, se perpetua, arrastando um número crescente de vítimas para um caminho sem fim. Pessoas que, sem identidade, perdem todos os seus direitos, pois a elas é vedado o exercício de algo valioso para o ser humano: o direito à cidadania.

                                                   Prof. Dr. João Carlos de Souza Ribeiro

Aline Barros Leva-me aos sedentos